Réu inocentado após 8 anos em SC: defesa aponta racismo estrutural no processoFoto: OAB-SC/Divulgação/ND MaisUm caso julgado em setembro no Tribunal do Júri de Itajaí, no litoral norte de Santa Catarina, reacendeu o debate sobre o racismo estrutural no sistema de Justiça brasileiro.
O réu, um homem negro, pobre e sem antecedentes criminais, foi inocentado após responder por oito anos a uma acusação de homicídio. A defesa sustenta que ele jamais deveria ter sido denunciado, e que o processo foi motivado por viés racial.
O advogado criminalista Thyago Jonny Souza, responsável pela defesa do réu, relatou que, mesmo diante da ausência de provas, o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) manteve a acusação por quase uma década. “O que te trouxe até aqui hoje foi viés racial”, declarou o advogado durante o julgamento, ao se dirigir ao seu cliente.
Segundo Thyago, a promotora do caso admitiu em plenário não ter provas contra o acusado, mas ainda assim deixou a decisão nas mãos dos jurados. “Ela disse: ‘não tenho provas, mas se quiserem condenar, fiquem à vontade’. Isso é um desrespeito ao princípio do indúbio pro réu”, afirmou o advogado em entrevista ao ND Mais.
MPSC reage e acusa advogados de ofensa institucional
As declarações feitas em plenário por Thyago Souza e pelo também advogado criminalista Argeu Estevam Debiazi — que afirmou que “os processos criminais no Brasil contêm cor e racismo estrutural” — provocaram forte reação do Ministério Público. Em nota oficial, o MPSC repudiou as falas dos advogados, classificando-as como “ofensivas e desrespeitosas”.
A instituição afirmou que as manifestações “ultrapassam os limites da liberdade de expressão e da inviolabilidade profissional assegurada aos advogados” e “configuram ofensa à honra objetiva do Ministério Público e atentam contra o decoro do Poder Judiciário”. A nota também destacou que, no caso específico, a promotora havia pedido a absolvição do réu.
Como consequência, o MPSC entregou representações formais à Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Santa Catarina (OAB-SC), solicitando a instauração de processo ético-disciplinar contra os dois profissionais.
OAB-SC defende apuração com isenção e destaca importância da gravação dos atos
O presidente da OAB-SC, Juliano Mandelli, afirmou que a entidade irá apurar os fatos com isenção, garantindo o contraditório e a ampla defesa. “A representação será analisada conforme determina o Estatuto da Advocacia. Se houver abertura de processo, ele tramitará sob sigilo”, declarou.
Mandelli também destacou a importância da gravação integral dos atos processuais, conquista recente da advocacia catarinense. “É justamente essa gravação que permitirá identificar eventuais excessos, seja de advogados, magistrados ou membros do Ministério Público”, afirmou.
O caso gerou ampla repercussão entre advogados da região. Muitos relataram episódios semelhantes envolvendo a promotora do caso e criticaram o que consideram uma tentativa de silenciar a advocacia combativa.
“Se o réu fosse branco, com maior capital social, dificilmente teria sido denunciado com provas tão frágeis”, argumentou Thyago Souza. “Esse é o retrato do racismo estrutural em funcionamento.”










